sábado, 28 de outubro de 2017

A Carga toda metida no contentor


A mais nova tem uma consulta. É preciso levar o Raio X, que entretanto não levantei. É preciso também levar o último antes deste. Não o encontro e levo o antepenúltimo. Chegamos atrasadas. A sorte é que a equipa que nos atende é 5* e perdoam-me estas pequenas falhas com boa disposição. Por sorte levei o RX da coluna. É que tinha um dos pulmões e aí sim seria por demais evidente a minha habitual carga mental.
Ainda só vamos em Outubro, o ano está longe de ter começado. Sim, não me enganei. Para mim os anos começam em Setembro.

Sobre a carga mental que uma mãe suporta.
Horário escolar; Horário fixo de actividades; Horas extras de ensaios e treinos. "Mãe, há estágio no dia dos meus anos!". Horário explicações. "Mãe esta semana tenho teste e mudou a hora da explicação!"
Pagamentos a fazer, de preferência dentro do prazo. Marcação de consultas. "Mãe, ando a ver mal; Mãe soltou-se um arame do aparelho; Mãe, preciso de levar o papel da consulta da medicina desportiva; Mãe tenho dores de costas.". Sessões de fisioterapia. Umas para mim outras para elas. São algumas as que me esqueço...
Datas dos testes. Relembrar se fez T.P.C. Lanche da manhã. "Mãe já não há fiambre!".Gerir almoços e diferentes horas de saída da escola. Reuniões na escola e nas atividades. "Mãe, esqueci-me de estudar esta peça de flauta! Mãe não sei onde fica o Ré!".  "Mãe, tinha um recado com a hora da reunião mas esqueci-me de te dizer!". Horário de atendimento dos DT´s aos EE. Domínio destas e doutras siglas! Falta encapar um livro. A mais nova não tem cola para  EV ou ET ou sei lá eu... Não tem saldo no telefone. "Mãe preciso de tirar fotocópias. Mãe, o que é encadernação em baguete?"
Calendário anual de atividades. Ver se tudo encaixa e em que dia calha a Páscoa e o Carnaval. Pelo menos o Natal é dia fixo.Quando têm férias. Quem leva e quem trás nas voltinhas da semana.
Vales de desconto dos hipermercados. Promoções a ter em conta. Prazos dos pontos acumulados em diversos cartões. Planos de festas. "Mãe, podemos fazer uma festa de halloween?", "Mãe, preciso de organizar o que vou fazer no meu aniversário!". "Mãe tenho uma festa. Compras a prenda? A X gosta de unicórnios, a Y gosta mais de ..." (qualquer coisa que agora não me lembro).
Concertos. "Mãe tratas dos bilhetes? Olha que depois esgotam! Vá lá Mãe!!!"
"Mãe preciso duns collants sem pé.";"Mãe, preciso de bata para as aulas da tarde" "Mãe, já ouviste este youtuber!?". "Mãe podes passar na portaria e deixar a justificação?"
Não há leite. O que havemos de jantar hoje?
"Mãe, podes fazer canja!?"
"Mãe, hoje não tinhas bodybalance?". Tenho andado a tentar. Ter algum equílibrio mental. Se ao menos conseguisse uma vez por semana! Tinha traçado um objetivo de 2 vezes, mas creio ter sido muito auspiciosa.
"Mãe, podes chegar aqui?" "Mãe, arranjas-me o cabelo?"

"Mãe, posso comer chocolate?"
SIM, PODES!!! Só não me faças tantas perguntas...E já que vais buscar traz-me um quadradinho.
(E é assim que surge a obesidade!)

E no que dá a carga toda metida no contentor?!
O assado ía sendo colocado no frigorífico.
Procurava pelo telemóvel enquanto falava nele.
Tinha uns óculos de sol no nariz outros na cabeça.
Li que pequenos esquecimentos são sinal de inteligência acima da média.
É isto. Só pode.
Uma pessoa que gere esta carrada de cenas só pode ser inteligente...

Inteligente e sortuda por ter um par destes de miúdas calminhas.
Compensa cada "Oh Mãe!".




terça-feira, 17 de outubro de 2017

"Vou para casa"

Não sou muito apegada a coisas. 
Até costumo dizer que se me dessem uma chave doutra casa e tivesse que deixar a minha para trás, incluindo móveis e afins, eu ía sem pensar muito nisso. Talvez levasse livros, fotografias, álbuns e recordações não eternizadas pela era digital.
Mas isto não é o mesmo do que perder tudo, do que deixar de ter um lar para onde voltar.
"Vou para casa" é algo demasiado precioso para que seja possível sequer imaginar o que será não poder dizer esta frase.
Não sou de apegos a objetos, roupas, sapatos... mas sou de apegos às imagens que constituem a minha vida... Custar-me-ía horrores perder os registos dos primeiros passos das minhas filhas, dos primeiros sorrisos, de viagens, de férias em família, enfim de todos os pequenos pedaços que fazem da nossa vida uma história.
Talvez por isso, num inquérito feito há uns anos quando perguntavam "Em caso de incêndio o que retirava primeiro de sua casa?(com excepção óbvia de pessoas e animais)" a maioria respondeu "Fotografias".
Compreendo. Dou por mim a pensar na resposta aquela pergunta. 
É difícil mas seria a mesma. Ainda assim agora temos as clouds e os backups na internet...tudo perdido não estaria… 

A mais nova é de apegos. Não sai a mim. 
Não gosta que eu dê roupa que já não lhe serve, livros de infância, fatos de banho, sapatos, basicamente nada. 
Diz que tem boas recordações do que viveu com essas coisas. Ou seja, ela quer as coisas pelas recordações que lhe trazem. Lá vai dar no mesmo. O que nos custa é perder as recordações como se de repente fosse através das coisas que elas saltassem da memória. 

Talvez porque se torna difícil ter apenas o presente, como se o passado não fizesse parte de nós. Perder certas coisas parece perder passado, com medo que a memória não chegue. 

No outro dia demos um par de sapatilhas a um amiga, sim porque dado a amigas ela não se importa….tanto (acho que é porque fica por perto). Às vezes ela pede para lhe devolverem. Diz que é só emprestado. Passo umas quase vergonhas já que entre amigos não há disto.

Sobre as tais sapatilhas disse-me “Oh mãe é que foi com elas que aprendi a andar de bicicleta!”. 
Nem eu me lembrava o que ela tinha calçado nesse dia…mas ela sabe!
A mim chega-me ter as imagens desses momentos. Não preciso das sapatilhas.

Mas preciso muito de dizer a frase "Vou para casa".